A PARTIDA DO FILHO DE ABRAÃO
Ben Abraham – Israel na cabeça e uma causa no coração
Abri a porta, deixei que corresse os olhos pelo quarto, apontei para a janela com as cortinas entreabertas e comentei: “É modesto, mas está a cerca de 100 metros da praia. Caso queiram caminhar, a região é belíssima”. O Dr. Ben, como sempre lhe chamei, olhou para mim, e com aquela voz grave que lhe era peculiar, disse: “Depois de tudo aquilo pelo qual passamos, qualquer coisa para nós é luxo”.
No dia seguinte, ao tomarmos o café da manhã, a Dona Miriam abriu uma pequena caixa e começou a dispor sobre a mesa uma multicolorida coleção de comprimidos. Olhei para aqueles dois fragilizados corpos e tentei imaginar “tudo aquilo pelo qual passaram”.
Essas foram as primeiras lembranças que vieram-me à mente quando recebi a notícia da morte do Dr. Henry Nekrycz, ou melhor, do “Filho de Abraão”.
Miriam Dvora Bryk, a fiel companheira.
Na Primavera de 2011 tive o privilégio de conviver algum tempo com o Dr. Ben Abraham e sua esposa Miriam Dvora Bryk. Conduzi-os pelas congestionadas e lentas ruas de Fortaleza, o que permitiu-me longas e agradáveis conversas; entrevistei-o num programa de televisão e preparei uma modesta instalação que falava sobre sua experiência.
Para isso, mergulhei na vida de bem Abraham. Pesquisei o que tinha na net, assisti vídeos, falei com pessoas e, principalmente, li sua obra.
Pensava que sabia quase tudo sobre ele, mas o fato de conviver, pessoalmente, mostrou-me que ele era bem maior do que aquilo que dele falavam.
Ben Abraham esteve em Fortaleza à convite do grupo Amigos de Sião, um movimento criado em São Paulo pelo Pastor Thomas Gilmer e sua esposa Linda há mais de 30 anos, e que desde 2009 está organizado também no Ceará.
Com Rômulo Braga, coordenador dos Amigos de Sião no Ceará.
Os Amigos de Sião é um grupo formado por goim e judeus que firmam entre si três compromissos básicos: Orar pela paz de Sião, conforme Salmos 122:6; defender o direito de Israel à sua capital eterna, Jerusalém, unificada e indivisível, conforme Isaías 62:1-12; e compartilhar que o Rei Eterno reinará de Jerusalém sobre todo o mundo, conforme Jeremias 3:17.
Na sua passagem por Fortaleza, o organizador da visita, José Nogueira de Lima, empenhava-se para que o Dr. Ben Abraham e sua esposa recebessem todas as homenagens que de eram dignos, por isso, e no curto espaço de tempo que dispunham, levaram-nos a todos lugares possíveis.
O casal foi homenageado na Câmara Municipal, no Ministério Público e nos Encontros dos Amigos de Sião. O Dr. Ben foi entrevistado em programas de TV sendo que num deles, o Coletiva, foi a figura central do programa.
Foram tantos os compromissos que no auge das atividades, extenuado, comentou bem humorado: “O Nogueira ainda acaba por fazer aquilo que Hitler não conseguiu: ele vai me matar!” Todos rimos e fomos para mais outra homenagem.
Ben Abraham com José Nogueira de Lima, o arquiteto das homenagens no Ceará
MOMENTO ÚNICO
Devo ao Dr. Ben Abraham uma das experiências mais interessantes da minha vida, uma daquelas coisas que acontecem, literalmente, nos bastidores.
Durante a emissão do programa Coletiva, da TV O Povo, enquanto o Dr. Ben era entrevistado no centro do estúdio, numa sala contígua além da D. Miriam estavam também os anfitriões, Nogueira de Lima e esposa, o organizador dos Amigos de Sião, Rômulo Braga e um alemão chamado Reinhold Federolf, da Beth Shalom, responsável pela publicação da revista Notícias de Israel.
Quem assiste hoje a íntegra da entrevista não faz ideia do que aconteceu nos bastidores. Éramos quatro os entrevistadores. Eu, como editor do NOTÍCIAS DE SIÃO; o radialista e membro da Comunidade Israelita Cearense, Saul Tavares; o professor de História André Rosa e o Diretor Institucional do Grupo O Povo, jornalista Plínio Bortolotti.
O Sr. Bortolotti, que não morre de amores por Israel, chegou ao estúdio trazendo nas mãos alguns livros do Dr. Ben numa atitude que a princípio enganou-me. Pensei que ele estivesse bem preparado para a entrevista, mas o porte dos livros mostrou-se mero adereço, uma vez que ele em nada referiu-se a terrível experiência vivida pelo entrevistado e fartamente documentada em seus livros. Bortolotti preferiu centrar suas em criticas ao Estado de Israel e em indiretas ao entrevistado.
E foi aí que aconteceu o inusitado. No intervalo, o alemão Reinhold Federolf irrompeu ao estúdio e interpelou energicamente o jornalista acusando-o de não respeitar o entrevistado.
Num primeiro momento, e pego de surpresa pela inesperada interrupção, confesso que fiquei um pouco desestabilizado. Assim que ouvi a pergunta, ideologicamente contextualizada, do Sr. Bortolotti, esbocei no papel que tinha à minha frente uma indagação que pudesse confrontar aquela provocação, mas quando o programa voltou ao ar, mal tive tempo de recompor-me mentalmente, pois o jornalista voltou à carga com outra pergunta capciosa.
Hoje, passados 4 anos do episódio e depois de receber a notícia da morte de Ben Abraham, sorri relembrando a cena, que considero uma das mais emblemática das quais já pude presenciar. Um alemão defendendo um judeu de uma provocação antissionista. Que cena!
Na saída da emissora desculpei-me pela atitude do entrevistador. O Dr. Ben sorriu e entre as grossas lentes dos seus óculos indagou-me: “O que você esperava de alguém a quem o pai deu o nome de Plínio?” Só então lembrei-me de Plínio Salgado e sorri.
Que figura foi o Dr. Henry Nekrycz, ou melhor, que figuraça foi o Ben Abraham! Quando for a São Paulo, be’ezrat Hashem, haverei de colocar uma pedrinha no seu túmulo.
QUEM FOI BEN ABRAHAM
Natural de Lodz, Polônia, Abraham nasceu a 11 de dezembro de 1924 recebendo o nome de Henry Nekrycz. Em setembro de 1939, com a entrada dos alemães na Polônia, os judeus foram confinados num gueto onde, aos 14 anos, Abraham acompanhou os primeiros fuzilamentos, enforcamentos e massacres de crianças.
Encaminhado para o Campo de Extermínio de Auschwitz, Abraham foi “comprado” por uma fábrica alemã de caminhões. Ali, viu diversos amigos serem levados para as câmaras de gás e assistiu à morte do pai. Numa entrevista, Abraham comentou: “Minha mãe dizia que ele teve sorte, pois [como morreu no gueto] ao menos teve um enterro judeu”.
Sorte que não teve a mãe, pois juntamente com ele foi levada ao Campo de Extermínio de Auschwitz, onde foram separados. “Despedi-me pedindo que D’us nos ajudasse a sobreviver à guerra para nos reencontrarmos. Nunca mais a vi. Uma mulher que trabalhava junto com ela disse que foi enviada por [Joseph] Mengele para a morte.”
“Vi chaminés do crematório funcionando dia e noite. Senti nas minhas narinas o cheiro da carne queimada e, naquela época, perambulando pelos campos, esfomeado e esfarrapado, jurei a mim mesmo que, caso sobrevivesse à guerra, contaria ao mundo [esta história] como alerta.”
Reconstituição de uma mesa de refeição no gueto conforme relatado nos livros de Ben Abraham: cascas de batatas; beterrabas e batatas raramente; pães com serragem de madeira; sopa de folhas de árvores; café improvisado com serragem e latkes de cascas de batatas.
Abraham dizia não saber qual era a mais terrível lembrança: a morte do pai, a despedida da mãe, as imagens da fumaça preta dos corpos queimando em Auschwitz. “Talvez seja a de quando alemães chegaram a um hospital no gueto e, levando crianças pelas pernas, esmagaram suas cabeças contra o muro e jogaram seus corpos em caminhões.”
Ben Abraham chegou ao Brasil em 1954 e recebeu a natiralização em 30 de janeiro de 1959. Quando presidiu a Associação dos Sobreviventes do Holocausto (Sherit Hapleitá) no Brasil, Ben Abraham defendeu que os jovens aprendessem nas escolas o que aconteceu durante a Shoah, a expressão pela qual os judeus designam aquilo que popularmente chamamos de Holocausto.
“É preciso aprender a história do passado para viver no presente e enfrentar o futuro com cabeça erguida”, afirmava Ben Abraham.
IMAGENS DOS ARQUIVOS DE NOTÍCIAS DE SIÃO
Caso queira ver estas ou as imagens anteriores em alta qualidade, basta clicar sobre as mesmas.
Ben Abraham e Miriam Dvora homenageados pelos Amigos de Sião
Ben Abraham, Miriam Dvora e José Nogueira de Lima: “Ele vai acabar me matando!”
Ben Abraham com Reinhold Federolf, o alemão que o defendeu.
Entrevistado pela TV Globo em Fortaleza
Mídia acompanhou os Encontros dos Amigos de Sião Especial
Jornalista ouve mais um relato
Ben Abraham e Miriam com a Promotora de Justiça Lucy Antoneli e o Defensor Público Josiel Rocha
Homenageado na Câmara Municipal de Fortaleza
Abraham e Miriam na Câmara de Fortaleza
Ouvindo os termos da homenagem na Câmara de Fortaleza
Recebendo a Placa Comemorativa das mãos do Dr. Elpídio Nogueira
Com o autor da proposta de homenagem, Elpídio Nogueira, em seu gabinete na Câmara.
Reconhecimento do Ministério Público do Estado do Ceará
No Ministério Público do Ceará
Discursando no Ministério Público
Miriam atenta a Abraham no Ministério Público
Ao lado do editor do NOTÍCIAS DE SIÃO falando a universitários
Encontro dos Amigos de Sião Especial
Mais de 800 pessoas ouviram o Dr. Abraham e a D. Miriam
Dr. Ben Abraham fala aos Amigos de Sião
Dr. Ben Abraham ouve Reinhold Federolf nos Amigos de Sião
Público de todas as idades ouviu a história do Dr. Ben Abraham
Adriana, José Vieira e Manuel de Deus: O Interior do Estado do Ceará presente nas homenagens
Uma instalação reproduzindo o ambiente do gueto fez parte do evento
Relatos extraídos da obra de Ben Abraham elucidavam aspectos obscuros da Shoah
AGRADECIMENTOS
O Blog NOTÍCIAS DE SIÃO, em nome dos AMIGOS DE SIÃO e das centenas de outros amigos que Ben Abraham fez ao longo da sua marcante vida, agradece à Família Nekrycz, na pessoa da D. Miriam Dvora e de sua filha Edith Nekrycz Wertzner, a forma altruísta como abriram mão da presença do esposo e pai durante tantos anos para que este pudesse mostrar ao mundo o horror que foi a Shoah, despertando consciências para que nunca mais algo sequer parecido possa tornar a acontecer. Todah Rabah Chaver.
COMPACTO DA ENTREVISTA DE BEN ABRAHAM AO PROGRAMA COLETIVA
Que o Eterno abençoe todos os que de algum modo contribuíram para que estes eventos pudessem acontecer. Agradeço também ao Eterno pelo privilégio que eu tenho de ver e ouvir fatos tão importantes para a história do povo de Deus! Shalon! Valeu Roberto continue firme e forte e com saúde!
A vida de Ben Abraham é um tapa na cara de todos aqueles que negam o Holocausto e quando esteve em Fortaleza – Ce, na IBF Cristo é Vida e na Câmara dos Vereadores estive presente nas duas ocasiões e através de seus relatos pude perceber que o Holocausto foi mais terrível do que já havia lido ou imaginado, o Eterno permitiu a sobrevivência de Ben Abraham para testemunharmos a fidelidade do SENHOR para com o Seu povo escolhido, por isso louvemos ao SENHOR pela vida de Ben Abraham e meus sentimentos a sua família por tão grande perda, que o Eterno os console, pois Ele é o Deus de toda consolação!!!
“Assim diz o Senhor dos Exércitos: Naquele dia sucederá que pegarão dez homens, de todas as línguas das nações, pegarão, sim, na orla das vestes de um judeu, dizendo: Iremos convosco, porque temos ouvido que Deus está convosco.” Zacarias 8:23
Todah Rabah, Dr. Ben…. Todah Rabah D . Mirian … Que o Eterno a conforte ! Tive o prazer de conviver um pouco com esse grande homem e com essa grande mulher ! E o mundo jamais esquecerá do seu exemplo de vida ! Ele fez com que o mundo jamais esqueça ! Eu e minha família continuaremos orando pra que o amor de Yeshua inunde seus corações ! Saudades ……
O sentimento que veio a mim quando soube do falecimento do Dr. Ben Abraham foi o mesmo que senti quando meu avô faleceu: estamos perdendo nossas raízes. Especificamente no caso do Dr. Ben Abraham, eu com tristeza pensei: “estamos perdendo um pedaço da história viva de Israel”. Que o Eterno console e conforte D. Mirian e sua família, e que lhes dê entendimento para crerem que o Messias é Yeshua.
Como é bom saber que o Nosso Senhor está no controle de tudo. Louvamos a Ele pela proteção e livramento dado ao Dr. Ben que possibilitou nos dias de hoje contar a história de como foi verdadeiramente… Que o Senhor conforte e console a família do Dr. Ben. A história passa e o testemunho fica.
Em poucas palavras alem de um exemplo de cumprimento as ordenacias e uma grande licao de Vida com Fe, Respeito, Esperanca e Obdiencia.
Para mim foi um imenso prazer conhecer esse grande homem e sua fiel companheira. Um grande privilégio poder ouví-los pessoalmente testemunharem sobre os horrores do Holocausto. Que o Eterno console a família nesse momento de dor.Seu exemplo ficará para sempre em nossos corações.
Possa o Eterno, Bendito seja, confortar grandemente o coração dos familiares queridos que aqui estão e que permitiram que pudessemos saber sobre este testemunho da verdade, comovente e heróico. Quem não gostaria de ter um vovôzinho tão simpatico e amigo ao seu lado? Eu gostaria muito. Se tivesse conhecido antes, seria meu avô querido!! Chazak, chazak venitchazek, família querida!!!
“Que Deus abençoe a sua memória”, e obrigado Irmão jornalista Kedoshim por ter preparado uma reportagem com uma memória predileta de Dr. Ben Abraham, sua esposa Miriam e de centenas de pessoas de Ceará e outros lugares distantes, aonde foram feitos encontros impactantes atravês dos encontros em Fortaleza liderados pelo Pr. José Nogueira, com o apóio da Igreja Batista Fundamentalista Cristo É Vida, da qual ele é Pastor, e também com o apoio dos Amigos de Sião.
Temos orado a favor de Dna Miriam, sua filha e todos que sentem a falta de alguém que deu tudo para ajudar todos a aprenderem lições do Holocausto para preparar um presente e futuro mais seguro.
Louvo a Deus por ter tido o privilégio de ter distribuído milhares de livros de Ben Abraham e de ter ajudado arranjar umas oportunidades para ele palestrar, apelando para as pessoas lembrarem da história triste e se conscientizarem para ajudar a evitar a repetição de tal.
Pr. Thomas L. Gilmer, Fundador
Amigos de Sião
Templo Batista de Indianôpolis
Agradeço ao SENHOR pela oportunidade e privilégio de ter conhecido o Dr. Ben Abraham. Eu e minha esposa ficamos apaixonados pelo casal Abraham (Ben e Mirian), pois foi muito bom conviver com eles nos dias que passaram em Fortaleza, por ocasião das solenidades, palestras e compromissos do Encontro dos Amigos de Sião.
Outro casal marcante nesse período foi o Pr. Reinhold Federolf e sua esposa Traude. Era realmente marcante participar de eventos com um casal sobrevivente do Holocausto e um casal de alemães, crentes no Messias de Israel – Yeshua Ha Mashiach, sionistas e pregadores da Salvação somente em Jesus, o Cristo.
Nas palestras e testemunhos do Casal Abraham, organizamos para que o Pr. Reinhold Federol pregasse sobre profecias bíblicas, as promessas de Deus para Israel e sobre o contexto histórico-cultural dos Evangelhos.
Nunca me esquecerei da manhã de domingo, que, depois do Dr. Ben Abraham ter falado sobre como sobreviveu ao Holocausto, o Pr. Reinhold pregou a mensagem “Nos Passos de Jesus”, em que fez uma retrospectiva do Evangelho. No final, os dois se abraçaram, e todos nós choramos!
Dr. Abraham (o judeu que perdeu toda a sua família no Holocausto promovido pelos nazistas alemães) olhou para o Pr. Reinhold (o alemão descendente daqueles que assassinaram os judeus) e disse: – Você é um justo!
Na linguagem bíblica sabemos o que isto significa!
Amém!